Excentricidade de um marajá indiano, o Swan Car é uma das peças mais curiosas do museu Louwman

A fantasia em matéria automóvel está longe de ser mania recente. Os exemplos de veículos mais ou menos originais, mais ou menos fantásticos proliferam. Um dos mais invulgares automóveis de que há memória, o Swan Car, está hoje exposto no Museu Louwman, um dos mais ricos do mundo, instalado num belíssimo edifício, construído de raiz por arquitectos norte-americanos, num magnífico jardim, paredes-meias com o palácio real holandês, em Haia. Um “saltinho”, desde Amesterdão.
Construído em 1910, em Inglaterra, este singular automóvel, com o peso de oito toneladas, pretendeu simular um cisne e reproduzi-lo em movimento sobre a água, mas essa foi apenas uma das originalidades que deram asas à criatividade da Brooke Company of Lowestoft, em Suffolk, responsável pela motorização (com 25/30 cv de potência) e chassis e, pensa-se, à Savage de Kings Lynn, o mais famoso construtor de carruagens a vapor da ilha de Sua Majestade, tida por responsável pela carroçaria em madeira trabalhada à mão, que emita o efeito das penas e exibe a toda a volta uma flor de Lotus gravada a folha de ouro.

O condutor podia fazer abrir e fechar o bico da “ave”, projectando um “spray” de água quente, através de um sistema ligado ao radiador, para desimpedir a passagem por entre a multidão

O Swan Car foi uma encomenda de Robert Nicholl “Scotty” Matthewson, abastado colono da Índia Britânica, apostado em chocar a elite de Calcutá, o que até conseguiu, pois logo na primeira saída do veículo foi necessária a intervenção da polícia.
Scotty passeava-se com o Swan Car pelo Maidan Park, onde todas as tardes desfilava, nas suas ricas carruagens, a nata da sociedade local. O condutor podia fazer abrir e fechar o bico da “ave”, projectando um “spray” de água quente, através de um sistema ligado ao radiador, para desimpedir a passagem por entre a multidão que enchia as ruas da capital da Índia Britânica. Uma válvula, na retaguarda, largava, por sua vez, um líquido de limpeza branco, que podia mesmo ser leite, de forma a deixar um rasto, com o intuito de aproximar a passagem do automóvel-cisne o mais possível da realidade do movimento sobre a água.
No banco traseiro, Scotty tinha um comando rotativo, semelhante aos utilizados nos barcos, accionado por uma alavanca de telégrafo, que lhe permitia dar as ordens ao condutor: vire à esquerda ou à direita, aumente a velocidade, tome a direcção de casa…
As excentricidades passavam ainda por um sistema de escovas para limpar os excrementos de elefante que se agarravam aos pneus e um sistema de iluminação eléctrica dos olhos do cisne e da coleira com luzes vermelhas a encimar o longo pescoço curvo.
O automóvel acabou por ser vendido ao marajá de Nabha, o qual, para dar continuidade às excentricidades, mandou construir à Circa, em 1920, um segundo carro, mais pequeno e baptizado “Baby Swan” ou “Cygnet”, alimentado por um motor eléctrico, que seguia a “mãe” nas suas deslocações.
Durante 70 anos o carro esteve esquecido e abandonado, na posse da família do marajá e, em 1991, quando foi adquirido pelo museu Louwman, o estado era tal que os ratos tinham dado conta do maravilhoso interior revestido a seda indiana. Recuperado e com toda a panóplia de “gadjets” a funcionar, o “Swan Car”, que está acompanhado pelo “Baby Swan” no museu de Haia, já ganhou, em 1993, um dos mais prestigiados prémios de elegância para clássicos, no concurso de Pebble Beach, na Califórnia.

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Com 230 automóveis, o Museu Louwman tem muito para mostrar, entre veículos recuperados e outros propositadamente expostos no estado em que foram encontrados. Exibe por exemplo, o célebre Aston Martin DB5 de James Bond, ao tempo do “reinado” de sir Sean Connery, e até uma tipóia portuguesa, primeira peça da mostra que pretende também explicar a evolução dos veículos com rodas. Como é natural, não falta uma completa alusão à indústria automóvel holandesa, com uma variada mostra dos modelos da Spiker e a evocação dos pequenos DAF. Grandes clássicos, como o segundo mais antigo automóvel do mundo, o De Dion Bouton & Trépardoux de 1887, Bugatti, Ferrari, Rolls Royce, veículos de competição (entre eles o Jaguar D-type vencedor de Le Mans em 1957), o Tatra 87, do austríaco Hans Ledwinka, que acusou Porsche de o ter copiado para fazer o “Carocha”, mas também a maior colecção de arte automóvel do mundo, incluindo pinturas, esculturas e posters preenchem os dez mil metros quadrados de exibição merecedores de uma visita.
Um Dodge para começar
A colecção Louwman foi iniciada em 1934 por Piet Louwman, importador da Chrysler e Dodge para a Holanda, que então adquiriu um Dodge de 1914, veículo ainda hoje com lugar de destaque na exposição. O património foi sendo alargado, mas só em 1968 todas as peças surgiram reunidas para exposição pública, no Museu Nacional Holandês do Automóvel, primeiro instalado em Leidschendam e, depois, em Raamsdonsksveer, já em 1981. Evert Louwman, filho do fundador, tem mantido a chama viva e foi com ele que se empenhou na construção da nova casa da mostra, um edifício de três pisos concebido pelos norte-americanos de New Jersey Michael Graves e Gary Lampera.
O museu funciona ente as 10 e as 17 horas, a entrada custa 14€ (entre 5€ e 7€ para crianças e adolescentes), dispõe de uma livraria e de restaurante, há visitas guiadas e em www.louwmanmuseum fica a saber como pode lá chegar.

Uma pequena amostra do muito que há para ver num museu que vale a visita