Desde menino quis desenhar automóveis. Agora, 15 anos depois de ter chegado à primeira equipa da Volkswagen, levado pela vitória num concurso, concretizou um sonho: há um carro a circular que leva a sua criatividade. Chama-se Arnaldo Cruzeiro, é brasileiro e o principal responsável pelo design do novo Touareg. A história de um craque… no design.

Mineiro de Ipatinga, licenciado em Design de Produto pela Universidade do Estado de Minas Gerais, em Belo Horizonte, Arnaldo Cruzeiro Silva Jr. foi o melhor num concurso de design promovido pela VW do Brasil, em 2001, e, como prémio, ganhou um ano de estágio no departamento local de Design. Em 2003, estava na Alemanha para outro ano de experiência, agora no estúdio mundial da marca, onde deu provas que mereceram o convite formal para enquadrar a equipa.

Para quem não queria outra coisa na vida, só havia um caminho: aceitar… E hoje é em Wolfsburgo, na cidade da VW, que, 15 anos depois, continua a trabalhar, como Creative Exterior Designer, sob a batuta de Klaus Bischoff.

“Todo o carro tem o seu desafio. No caso do Touareg, as dimensões obrigam a trabalhar as proporções muito exaustivamente. É grande e comprido. Mas acho que conseguimos um resultado muito bom. Sendo o produto top da marca, tivemos muitos recursos, ajudou bastante”, diz Arnaldo Cruzeiro

“Low-profile”, ar de menino mesmo que à beira dos 40, Arnaldo Cruzeiro integrava a equipa de especialistas da VW que estava em Scheffau, na Áustria, para falar aos jornalistas sobre o Touareg. É claro, conversei com ele e fiquei com a certeza de que vamos continuar a ver trabalhos seus na primeira linha de produtos da marca alemã. Diz-se que o T-Cross – o previsto pequeno SUV VW também leva algo de seu – desenvolveu o concept Breeze. Apenas sorriu perante a questão… mais tarde, bem disposto, numa mesa onde teve a oportunidade de “desenferrujar” o português com um grupo de jornalistas.

Touareg é “filho” especial

Arnaldo Cruzeiro admite que lhe chame o “pai” do Touareg, mas ressalva que houve “um grupo muito grande de pessoas envolvidas no projeto”. Seja como for, está ligado “às primeiras ideias, os primeiros rabiscos e traços no papel”.

Um “filho” especial? – pergunto.

– Sim, muito especial – diz-me com um brilhozinho nos olhos, a revelar a pontinha de orgulho que não exterioriza.

– Esta profissão é qualquer coisa que queria desde criança. Então, quando você consegue tornar isso realidade, tem sabor muito especial.

Desenhado por brasileiro, é o Touareg um carro com samba? – pergunto-lhe, enquanto a conversa flui fácil.

Outro sorriso e resposta na ponta da língua, sempre em discurso pausado, sereno, apesar do prazer e da paixão que se percebe nos gestos que acompanham cada palavra.

– Sim. Você vê que tem formas um pouco mais sensuais, mais expressivas, é um carro mais desportivo. A gente procurou trazer para a nova geração do Touareg um pouco mais de emoção.

O retrato é bem definido e assim continua perante a questão de ser ou não mais difícil trabalhar as proporções de um SUV de grandes dimensões.

– Todo o carro tem o seu desafio. No caso do Touareg (ele diz “a” Touareg), as dimensões obrigam a trabalhar as proporções muito exaustivamente. É grande e comprido. Mas acho que conseguimos um resultado muito bom. Sendo o produto top da marca, tivemos muitos recursos, ajudou bastante.

E ajudou, por exemplo, ter a liberdade, como me disse, de não ser preciso partilhar as portas com o Porsche Cayenne. Isso permitiu “trazer” para o Touareg um elemento que ele queria estampar nas laterais, aquele “jeito” a emprestar músculo bem trabalhado, a moldar de outro modo a envolvente das rodas traseiras. Isso é dele! E bem feito.

Um choque ver o carro “fora” do papel

E o que sentirá um designer quando vê um automóvel “sair” do papel?

Ligeira pausa, reflexão, e resposta franca:

– Como trabalhei no projeto desde o começo, quando o vemos o Touareg na rua, é um choque! Há o carro, ali. E o que mais me impressiona é que quando isso acontece significa que está tudo aprovado, tudo funciona, tem um motor, interior de verdade. E aí você começa a pensar na grandiosidade do projecto, no monte de gente envolvida para fazer aquilo. É uma emoção muito grande. E imediatamente eu me lembro do dia em que estava desenhando e achando uma solução para o para-choques, para  a ligação da grelha (diz “a grade”) com os faróis. Você consegue recuar no tempo e lembrar esses momentos….

E quando olha para o Touareg e pensa na concorrência?

– Penso que a Volkswagen tem um team muito bom!

E sorri. Sorri muito. Satisfeito e divertido.

Este designer com “jeito” de craque – os brasileiros, regra geral, são bons de bola, Arnaldo é bom de lápis e no traço! – está ligado a outros projetos e designadamente a quanto envolve o design de uma grande aposta da VW, os automóveis elétricos.

Tem trabalhado em projetos que nem são conhecidos nessa área nova do design, e integra o grupo daqueles que entendem estarmos perante a oportunidade de mudar a arquitetura do automóvel.

– Nós fazemos muitas propostas e a maioria das coisas, infelizmente, não vai para a frente, há uma grande competição. Quando há um projeto novo, todos fazem propostas, mas sabemos que um só vai para a frente. E esse depende muito do que a fábrica está querendo, da visão dos nossos chefes.

Até aqui, não acertou no alvo, mas acredita que os recentes show-cars da VW, como IC Cross e ID Vizzion têm rodas para andar…

E fiquei convencido de que nos vamos habituar ao traço de Arnaldo Cruzeiro, também ligado a face-lifts do Tiguan e do Touareg, show-cars como o T-Cross Breeze e T-Prime. Não é pouco!