Gostos não se discutem! E a máxima é válida também para o automóvel. A história guarda momentos menos felizes para algumas marcas em matéria de estilo e imagem de vários modelos. Ford Scorpio e Fiat Coupé estão entre aqueles que suscitaram reparos menos simpáticos… Renault (Vel Satis), Lancia (Thesis) e Citroën (C6) também não escapam na lista reduzida dos emblemas mais conhecidos.

A Ford teve um topo de gama sob a designação Scorpio, lançado para substituir o Granada. Predecessor do Mondeo, foi um modelo produzido (1985-1998) exclusivamente na Europa (na fábrica de Colónia) e apontado para competir com os premium europeus. As coisas ainda não eram o que são hoje e os “papões” alemães tinham expressão diferente. E ainda havia os nórdicos que juntavam à lista a histórica Saab, desaparecida na voragem dos números, não obstante até ter alguma expressão nos EUA.

Ora, o primeiro Scorpio fica para a história como o modelo que lança o ABS – e que diferente era…. sentir o pedal a vibrar debaixo do pé. Não se mostrava particularmente vistoso,  e quando foi lançada a segunda geração, para o envolver nalgum “glamour”, natural para o nível do produto, teve uma apresentação estática em Colónia. O palco escolhido foi um agradável pavilhão, tipo jardim de inverno, onde, em ambiente com um toque de requinte (ainda se usava fato e gravata), a Ford mostrou o novo automóvel e facultou o contacto com alguns dos quadros do seu gabinete de design.

Entre canapés e champanhe, chegou a hora de, com a pompa e circunstância sempre associada a estes momentos, destapar o carro. E o que então se passou é inesquecível: talvez uma centena de jornalistas literalmente de boca aberta e um ambiente daqueles a sugerir que, se houvesse um buraco, o pessoal do design da Ford entraria nele muito depressa e com todo o prazer…

Franceses e ingleses, sobretudo, foram implacáveis nas críticas. “Batráquio de luxo”, por exemplo, foi um dos apodos que deram a um automóvel que integra alguns dos rankings para os dez modelos de automóveis mais desajeitados, pelo menos, do século passado… Faróis disformes, que lhe entristeciam a frente, dominada por uma grande grelha larga e baixa, e uma solução de barra de luz na traseira, muito americana, linear e deselegante sobre o para-choques são os pormenores que nunca se esqueceram, num conjunto do qual, por alguma razão, nunca foi muito falada a paternidade do design.

As realizações mais badaladas pela controvérsia envolvem modelos topo de gama, como que a provar que esta não é “a praia” dos generalistas

A este nível encontram-se muitas referências a outras aventuras menos bem sucedidas de construtores generalistas. Para uns, modelos demasiado ousados, para outros rotundos falhanços do design, ainda que envolvendo nomes com pano no colarinho na arte de criar automóveis. Todos têm um aspeto em comum: venderam muito pouco!

As realizações mais badaladas pela controvérsia passam por modelos topo de gama, como que a provar que esta não é “a praia” dos generalistas e, entre eles, Renault Vel Satis (2002/2009 – desenhado por Patrick le Quément, o mesmo do Avantime), Lancia Thesis (2001/2009 – quando o americano Mike Robinson passou pelo Centro Stile Lancia) e Citroën C6 (2005/2012 – Jean-Pierre Ploué). Por acaso, assisti às três apresentações e lembro momentos de surpresa e espanto mas, em boa verdade, nada como a cena da Colónia.

A estória do Fiat Coupé tem como protagonista o bem humorado Francisco Sande e Castro e o semanário “Independente”, no qual então ele assinava uma rubrica de automóveis. O desportivo da Fiat, também ele ligado, na apresentação internacional, a um lugar muito especial, Nice e o emblemático Hotel Negresco, era, no mínimo, pouco consensual no estilo. Tinha algumas originalidades como a entrada do depósito de gasolina saliente como num antigo carro de competição e o tablier com uma barra sem revestimento, em chapa na cor da carroçaria, a simplificação máxima para uma imagem mais desportiva  –  era evocação original, interessante e até teve seguidores. As formas da carroçaria do coupé 2+2 é que convenciam pouca gente.

O Francisco encontrou uma forma sui-generis para retratar a imagem do desportivo italiano na crónica dedicada à apresentação: sabonete! Valha a verdade, era uma saída que parecia adequada, mas os nossos amigos da Fiat é que não acharam graça nenhuma… Até porque, ainda por cima, a ideia pegou, pelo menos no meio.

Com aquele sorriso de menino que mantém, o Francisco, que anda a dar à volta ao mundo de moto e conta as suas aventuras no Motor24, lá ouviu as críticas e as piadas saudáveis do reduzido grupo de jornalistas que então garantia a informação especializada.

O “sabonete” também ficou muito longe e ser um êxito. Ainda há  por aí alguns.

Na Fiat há, ainda, outra realização que divide opiniões: a Multipla, sem dúvida projecto original e inovador no conceito, controverso, porém, no estilo. As formas, que o colombiano Botero provavelmente não desdenharia numa das suas estátuas de proporções exageradas da figura materna, ainda hoje fazem parte da lista dos automóveis que nunca saberemos se eram um desastre ou demasiado avançados….

Há outros momentos de estupefação como aquele de Colónia, e, recorda-me quem viveu, em França, a cena inesquecível que rodeou o lançamento interno do Renault  Vel Satis, que se retrata num generalizado olhar incrédulo da “família” da marca ao ver o protótipo do topo de gama. Houve quem dissesse que só faltava a torre do canhão no que parecia um tanque de guerra… A altura da carroçaria ainda foi reduzida, mas nada impediu que este tenha sido um dos menos bem sucedidos modelos da marca francesa…

O mesmo le Quément foi responsável pelas equipas que criaram automóveis tão marcantes como o primeiro Twingo e a família Megane. Ora, ninguém é perfeito e ele até me disse um dia, ao autografar-me a sua biografia, editada na Automobilia, que o então superadmirado Mercedes SLR, na altura paradigma dos grandes desportivos, era  “o Mercedes schwingun”. Opiniões…