É, para mim, mais um sério aviso chinês ao mundo do automóvel elétrico. O BYD Atto 3, SUV do segmento médio, tem armas e argumentos que prometem mudanças no mercado global. Não é uma chinesice, mesmo que haja, naturalmente, pormenores a rever. Ousado, bem construído, menos datado no estilo do que seria de prever, 204 cv, bateria de 60,48 kwh, 420 quilómetros de autonomia é um familiar à altura de pedir meças aos europeus. E, na versão que guiei, custa 43 490€.
BYD, acrónimo de Bild Your Dreams, ou construa os seus sonhos, é o maior construtor chinês de automóveis elétricos, produz mais de milhão de unidades e tem a seu favor o controlo absoluto do processo produtivo: constrói as baterias, os motores, grande parte dos chips, a plataforma.
Tem uma parceria com a Toyota, à qual vende motores, e a sua tecnologia de baterias laminar, que permite redução das dimensões, é original e usa iões de lítio e fosfato de ferro (sem cobre nem níquel e menos lítio), o que, em princípio, promete melhor compromisso ambiental, menos custos e mais segurança
O Atto 3 é um SUV de estilo convencional, com uma frente personalizada a ponto de resolver muito bem a falta da grelha, substituída por uma superfície convexa separada do capô, arrendonado, por uma barra que integra os faróis e tem ao centro a designação BYD. Duas grandes entrada de ar compõem o conjunto, na procura de uma imagem mais desportiva e moderna.
O perfil, marcado pelo tejadilho levemente descendente, é limpo e simples. Músculo criado entre três suaves vincos, cintura alta, e uma custódia amenizada por uma uma decoração à imagem de uma peça em alumínio “escamado”. Vistoso.
BYD Atto 3 é para encarar como proposta séria da indústria chinesa e um grande desafio ao mercado. Bem construído, nível de qualidade em patamar elevado, autonomia e consumos dentro da média, cómodo e espaçoso, só no preço muitos esperariam melhor
A traseira tem um portão simples que, por contraponto à frente, é dominado por uma superfície côncava. Bem pensado. O deflector prolonga o tejadilho, as luzes não dispensam o fio de LED de ponta a ponta remato pelas óticas e sobre o qual se destaca, em relevo, a designação Byld Your Dreams.
A toda a volta existe a tradicional bordadura plástica negra de proteção e o resultado de tudo isto afasta-nos da ideia feita sobre o automóvel chinês. Mais elaborado, mais aproximado de formas europeias.
Interior jovem, ousado e carregado de originalidades
O interior é uma enorme surpresa, nem todos podem gostar da fantasia, mas é interpretação jovem e ousada da modernidade, com pormenores muito interessantes. Desde logo, o tablier que se assume com uma onda a desfazer-se sobre a superfície inferior. O contraste de cores acentua o efeito. Diferente.
As saídas de ar, como cilindros feito de aros cromados, são outro pormenor original, a par, aliás, com os fechos das portas, colocados sobre a caixa redonda que envolve os tweeters, como se fossem uma cobertura. Sem igual.
Outra graça, as bolsas das portas recorrem a três fios de suporte (vermelhos fixos em cilindros cromados) esticados como se fossem as cordas de uma guitarra que terminam no cento do altifalante. Até tocam…
O painel de instrumentos, legível, grafismo interessante é um pequeno quadrante digital (ao estilo VW) agarrado à coluna de direção com um volante multifunções que se enquadra neste ambiente como peça de puzzle. Falta a indicação da média de consumo, “perdida” no ecrã central…
Quanto a este, dimensões generosas – 15,6 polegadas – e a curiosidade de o podermos fazer rodar 90 graus (botão no volante) e usá-lo também na vertical. É uma questão de gosto. Pena que a linguagem do software seja pouco amigável e que as dedadas “decorem” a superfície a ponto de incomodar com a luz. Pormenor a rever.
Enfim, uma consola flutuante com os únicos botões físicos do Atto 3 e dominada por um seletor de marcha em forma de puxador, muito prático de utilizar e que inclui na base a posição de parque. Logo à frente o botão de ignição. Não falta o carregador wireless nem a caixa sob o apoio de braços. E espaço no vão criado até ao fundo.
Bancos em pele sintética, debroados a vermelho e pespontados na mesma cor, com bom apoio mas assento curto e recostos de cabeça fixos, dão o último retoque no ambiente e num habitáculo que não levanta problemas de espaço. Também atrás, onde o fundo plano mostra as suas vantagens e a possibilidade de passar os pés sob os bancos dianteiros ajuda no conforto. O recosto central, como habitualmente, penaliza quem for ao meio…
A qualidade geral surpreende, com a maioria dos plásticos envolvendo a sensação de ligeiro almofadado e os outros, poucos, menos nobres, sedosos e agradáveis ao toque. Uma escolha muito criteriosa que põe o Atto em patamar alto em termos de materiais utilizados.
A bagageira tem 440 litros de capacidade, valor dentro das exigências, mas tem pouca altura e o plano de carga é um pouco elevado. Não se pode ter tudo num elétrico!
Máquina não destoa e posiciona-se em bom nível
Se o “embrulho” convence o conteúdo tecnológico não lhe fica atrás. Utiliza uma plataforma dedicada para automóveis elétricos que acomoda a fina bateria entre as rodas. No caso do Atto 3, o motor é dianteiro, debita 204 cv e o binário de 310 Nm. Esta capacidade e o peso de 1750 kg (420 da bateria), permitem-lhe acelerar de 0 a 100 em 7,3 segundos e atingir os 160 km/h em velocidade de ponta. São prometidos 420 quilómetros de autonomia e 565 em utilização apenas citadina (valores WLTP).
Eu não consegui ir tão longe numa utilização maioritariamente suburbana, com alguma autoestrada, e no respeito dos limites. Com 50% da carga disponível, utilizando sempre o ar condicionado, cumpri 175 quilómetros, logo a automia seriam 350 quilómetros – a indicação de bordo dava, no entanto, mais 220 km. Fazendo as contas temos a média de 17,28 kW/100, mais do que os 16 prometidos. Mas a verdade é que em grande parte do percurso o computador de bordo indicou 16,4. São números razoáveis.
Este resultado foi conseguido optando pelo modo Eco, com pequenos incursões pelo Nomal e o Sport. Entre os dois primeiros a diferença é pouca, mas quando se puxa pelos galões do Atto 3. Em Sport, as coisas mudam um pouco de figura, mesmo sem serem esmagadoras.
De qualquer modo, aqueli que mais surpreende é a pouca capacidade regenerativa. Regulável em duas posições, fica muito aquém daquilo a que estamos habituados. Numa descida, pode acontecer até que o carro ganhe velocidade. Outro pormenor passível de revisão.
Suspensão independente, multibraços atrás, o Atto 3 é um carro com a dinâmica própria de um familiar. Nada de grande mordacidade em curva, mas não se descompõe perante um exagero e o controlo de estabilidade logo desperta. Mas não foi desenvolvido a pensar em comportamento desportivo, ainda que a resposta pronta às solicitações do acelerador nos “atire” para andamento considerável.
E um excelente rolador cómodo, com boa filtragem nas estradas menos boas. Podia ter uma direção mais responsiva, mas ganha-se indo ao ecrã optar pela regulação desportiva, mais firme.
Carrregamento a 88 kWh e bom equipamento
No que respeita ao carregamento, porta à frente do lado do passageiro, o Atto 3 está preparado para receber 88 kW DC, o que permite levar a carga dos 30 aos 80 por cento em 29 minutos e dos 10 aos 80 em 44 minutos. A 7 kW em AC, o “pleno” atinge-se em nove horas e 42 minutos.
Em termos de equipamento, a versão Design que guiei incluía teto panorâmico elétrico, abertura automática da bagageira, jantes em liga de 18 polegadas, bancos em pele sintética, ecrã rotativo de 15,6 polegadas, entrada e ignição sem chave, cruise control inteligente, bomba de calor, carregador de bordo de 11 kW, bomba de calor, visão de 360º, sensores de estacionamento à frente e atrás, travão de parque elétrico, deteção de ângulo morto, alerta de colisão dianteira e traseira, travagem automática.
Enfim, o BYD Atto 3 é para encarar como proposta séria da indústria chinesa e um grande desafio ao mercado. Bem construído, nível de qualidade em patamar elevado, autonomia e consumos dentro da média, cómodo e espaçoso, só no preço muitos esperariam melhor.
Uma nota: não é despiciendo lembrar que a representação tem o aval da Salvador Caetano e existe um acordo com a Toyota. Os chineses no seu melhor…
FICHA TÉCNICA
BYD Atto 3
Motor: elétrico, síncrono, magneto permanente
Bateria: 60,48 kWh (úteis), iões de lítio e fosfato de ferro (420 kg)
Potência: 204cv
Binário: 350 Nm
Transmissão: tração dianteira, velocidade única
Aceleração 0-100km/h: 7,3 s
Velocidade máxima: 160 km/h
Consumo: 16 kw/100 km
Autonomia: 420 km; 565 km em cidade
Peso: 1750 kg
Dimensões: c/l/a – 4,445;1,875; 1,615 m
Bagageira: 440 litros
Preço: 43 490€